25/03/2018

Um bom professor tem de frustrar!

Em conversa com amigas, falávamos da capacidade que os professores têm de chegar aos seus alunos todos. Ou melhor, da capacidade que deveriam ter.
A verdade é que não é fácil fazê-lo. As turmas são grandes demais e os programas são feitos para serem ensinados em 2 anos e não em 9 meses.
Mas também é verdade que é suposto um professor dar o seu melhor. Querer dar o seu melhor. É suposto que um professor faça uma auto-análise e consiga perceber o que está a correr bem e o que está a falhar. É suposto que um professor queira fazer isso porque a profissão que escolheu precisa que o faça. Porque um professor não lida com coisas, lida com pessoas. Lida com pessoas numa fase crucial do seu desenvolvimento e da sua formação. Quando um professor falha, pode comprometer para sempre a pessoa que tem à sua frente.
Se todos pensarmos nos professores que mais gostámos na nossa infância, todos nos lembramos de, pelo menos um, que dava o litro por nós. Que nos olhou nos olhos, que reparou em nós e que tudo fez para que gostássemos das suas aulas. Também é verdade que, a maior parte das vezes, gostámos desse professor porque ele foi inconvencional. Lembro-me de uma professora de Geografia que dançava nas aulas! Era doida! Falava alto! Gesticulava muito! Mas tudo no bom sentido! Ela vibrava de tal maneira com a matéria que debitava, que nos contagiava. Nunca tive menos de 95% nos testes dela. A sua forma de dar a aula era tão diferente e feliz que a matéria era imediatamente absorvida e quase não precisava de estudar. Quando o fazia, fazia com gosto! E também porque não a queria desiludir devido ao facto de gostar genuinamente dela e das suas aulas.

Quando saio da escola, costumo ir no carro a fazer um resumo do dia enquanto vou buscar os meus filhos. Fico verdadeiramente triste quando percebo que alguma criança me passou despercebida nesse dia. Ou porque não tive tempo de olhar para ela, ou porque alguma coisa me privou de lhe dar atenção a algo que para ela era importante mas eu tive outra coisa mais urgente para resolver.  Não é suposto isto acontecer todos os dias. Muito menos sempre com a mesma criança. É suposto um professor (educador) frustrar! Mas é suposto frustrar e querer compensar o erro que levou a essa frustração. Quando frustramos é porque demos conta das nossas falhas e nos preocupámos o suficiente para frustrar. E então é preciso passar por essa frustração para podermos, no dia seguinte, compensar essa falha.

Não é possível dar a mesma atenção a todos os alunos diariamente. Tal como uma mãe não consegue amar os filhos da mesma forma e na mesma quantidade todos os dias. É preciso encontrar as necessidades e ir respondendo à medida que elas vão surgindo. E se hoje dou mais atenção a um filho porque hoje é esse filho que precisa, com os alunos temos de fazer exactamente da mesma forma. Se hoje não dei atenção àquela criança porque houve outra que precisou de uma atenção mais urgente, amanhã é dia de compensar.

Não é fácil! Não é nada fácil! Mas é preciso pensar, é preciso analisar e é preciso frustrar! Para que essas frustrações dêem lugar às compensações e às reparações de falhas.

18/03/2018

Era uma vez um 18 e um Cesário Verde

Andei num colégio onde as notas eram valorizadas. Bastante valorizadas. Valorizadas demais. Adorei lá andar mas não punha lá os meus filhos, precisamente por causa disso. Valorizo muito mais o esforço e a superação, do que o resultado em si.

Eu era uma aluna de 15. Provavelmente seria considerada uma excelente aluna numa escola pública da época, mas ali não. Eu sentia-me por vezes constrangida pelas notas que tinha. Quando as notas não eram nada más.

Lembro-me de um dia, quando a professora de português vinha no corredor para nos dar aula, com os testes corrigidos debaixo do braço, todos corrermos na sua direção.

- Stôra! Quanto é que eu tive?

Ela ia elogiando os alunos à minha volta com festas na cabeça e apertos carinhosos de incentivo no braço.

- Tiveste 19! Parabéns! Tiveste 18 minha querida! Tiveste 20, não esperava menos de ti!

Lembro-me de lhe ter feito exactamente a mesma pergunta e ela me ter sacudido a mão (com umas unhas enormes e encarnadas) à frente da cara e, sem sequer me olhar ter atirado um "Tu tiveste 15..." completamente vazio de expressão ou sentimento.

A verdade é que o 15, para mim, era óptimo! Mas não deixei de me sentir humilhada no meio daquela confusão de elogios que ela fazia questão de atirar para cima de todos. Menos para cima de mim. Como se eu não fosse suficiente! Ela não tinha orgulho em mim e nem sequer se interessava.

O Exame Nacional chegou. Assim que percebi que o tema era Cesário Verde, rejubilei. Era um dos meus autores preferidos!

Deixei naquela folha de ponto o meu coração na interpretação do texto. Vibrei em cada palavra e linha que escrevia.

As notas saíram. Tive 18! A melhor nota do colégio no Exame de Português. Subitamente transformei-me na aluna preferida daquela senhora baixinha e redonda de cabelo platinado e os dentes sempre sujos de batom encarnado. Arrastou-me por um braço enquanto bradava aos céus pelos corredores do colégio que a SUA (como lhe conveio naquele momento) aluna tinha tido a melhor nota no Exame Nacional.

Eu revirava os olhos e seguia-a forçada. Deixei-a ter esse prazerzinho momentâneo enquanto o celebrava por dentro só para mim. Ambas sabíamos que aquela nota não tinha sido graças ao seu trabalho. Mas a vaidade não a deixou ser minimamente humilde ou sentir qualquer remorso dos safanões cheios de desprezo que me atirou à cara à frente de todos com os meus 15's nos testes.

Foi nesse dia que aprendi uma grande lição. Até hoje! Que não podemos esperar que os outros façam por nós o que precisamos fazer por nós próprios. Que vai sempre haver alguém a aproveitar-se dos nossos sucessos. E que as coisas, quando são esforçadas com paixão (como aquela que eu tinha por Cesário Verde) saem sempre melhor do que quando as fazemos por obrigação.

Hoje estava no banho a fazer um breve resumo da minha vida e do sítio onde cheguei. E apercebi-me da quantidade de Exames que transformei em 18's e que, desde aquele dia em que saíram as notas do Exame Nacional, nunca mais deixei nenhuma Professora Regina fazer-me sentir humilhada pelos meus resultados.











15/03/2018

E ainda não são 9:00...

Já gritei com uma alemã!
Já discuti em inglês!
(Fiquei super orgulhosa por ter encontrado as palavras certas no meio dos nervos e antes de ter tomado o pequeno-almoço)
Já andei ao ponta-pé com um cão!


Já é a terceira vez que aquele cão fisga o meu lá do fundo e mete uma abaixo para o vir atacar!
Já é a terceira vez que ando ao ponta-pé com o cão e ele me morde!
Já é a terceira vez que digo à mulher que não pode passear um cão daqueles sem trela!
Já é a terceira vez que a gaja grunhe comigo em inglês hitleriano antes das 8:00 da manhã.

Tenho de perder o hábito de passear Mr Darcy sem o telemóvel! Nunca consigo chamar a polícia!

Se o resto do dia puder decorrer sem acontecimentos de maior, agradecia. Já basta a chuva às portas da Primavera.

13/03/2018

Uma pessoa tenta! Nem sempre consegue... Mas tenta!

Tenho andado a tentar encaixar quatro vidas nas 24h que o dia tem. Não tem sido fácil... Tendo em conta que 8h são passadas como educadora e cerca de 6h são passadas a dormir, sobram-me cerca de 10h por dia para ser Mãe, tratar da casa, comer, respirar e meter-me em projectos megalómanos (que estou ansiosa por contar). Uma vez ou outra, também faço um xixi e tomo duche!
A verdade é que tenho andado de rastos... Mesmo de rastos... E ainda por cima culpada por andar de rastos. A verdade é que só tenho a agradecer tudo o que está a acontecer. A agradecer tudo o que ando a fazer. A agradecer as oportunidades que me chegam às mãos. À vida!
A prova de que, coisas boas acontecem, é que, ainda há uns meses andava a carpir um coração destratado, a achar que a minha vida estava em cacos e agora só me apetece abrir garrafas de champagne e fazer brindes.

Do pouco tempo que me sobra, tento ser uma boa mãe. Tento dar-lhes atenção, ouvi-los, olhar para eles quando falam comigo e fugir à tentação de despachar refeições improvisadas no sofá. E enerva-me que o pouco tempo que tenho para ser mãe, e que tento com todas as forças que seja de qualidade, seja muitas vezes gasto a mandá-los para o banho, a refilar por implicarem um com o outro ou a repetir 30 vezes no supermercado que "não! não vos vou comprar porcarias!".

Tenho ido ao supermercado a conta-gotas porque, nem para fazer compras de jeito tenho tido tempo. Vou a voar ao fim do dia comprar 3 ou 4 coisas que faltam e volto a voar para casa na tentativa de passar o pouco tempo de filhos sem ser a voar. (que acaba por ser sempre...)

- Meninos, vamos num instante ao supermercado!
- Podemos comprar alguma coisa para nós?
- Claro! Bananas para o teu pequeno-almoço! Leite, iogurtes para levares para a escola! Vamos comprar as coisas todas para vocês!... (termino a minha afirmação sarcástica com um revirar de olhos!)

Não vale a pena... Entre o pão e a fruta mandei-os parar de se empurrarem 4 vezes! Mandei-o parar de insultar a irmã umas 10 vezes! Disse-lhes que NÃO a 15 produtos diferentes! E a minha tentativa de ser uma boa mãe foi começando a desaparecer à medida que os meus olhos começavam a ficar cada vez mais encarnados, a minha voz começava a ficar cada vez mais cavernosa e o fumo começava a sair pelas minhas narinas.

Tinha-lhes prometido comprar gelados para a sobremesa porque não tínhamos tido tempo de ir à tarde comer um à rua. Claro que, perante todo aquele comportamento, às duas por três informei-os que já não íamos levar gelados nenhuns... Virei-lhes as costas e segui decidida para o corredor do leite! Quis o destino que me enganasse e que fosse direitinha ao corredor do vinho. (se calhar foi um acto falhado!) Ali parei! Juro que parei! Fiquei a contemplar as prateleiras recheadas de garrafas de vinho enquanto eles me seguiam e discutiam de qual seria a culpa por terem ficado sem os gelados da sobremesa. Por breves fracções de segundos pensei dar-lhes a chave do carro e dizer-lhes:

- Tomem! Vão para casa! Vou ali buscar uns queijos e passar a noite aqui mesmo! Na secção vinícola.

Mas afinal não... Viemos para casa e tentei ser uma boa mãe! Controlada e meiga até os enfiar na cama e vir dar pulos de alegria para a sala e continuar a trabalhar no computador até falecer de sono.

04/03/2018

O cenário é medonho!

São 22:00 e apercebo-me que não tenho comida para Mr Darcy. Com o cão enfiado no carro, vou direita à bomba de gasolina.
O Kikimobil está amarelo! A chuva do fim-de-semana trouxe uma espécie de lama peganhenta e amarela que deixou o meu carro num estado inacreditável de sujo.
Na telefonia começa a dar o "All by myself" e eu gozo o meu momento Bridget Jones. Meto o volume no máximo que as colunas permitem e vou a cantar aos berros.
Paro o carro à porta da bomba. Três homens a beber cerveja à porta. Olham para mim, naquele carro amarelado, com o Eric Carmen (e eu) a darmos o nosso melhor.
Saio lá de dentro com um ar amoroso de domingo à noite. Chocolate numa mão para alargar no sofá, duas latas de comida para cão na outra. À minha espera Mr Darcy a abanar a cauda de felicidade (porque já não me via há 40 segundos) e as patas da frente em cima do volante. E o meu Kikimobil pintado de lama amarela a sorrir para mim.
Dou à chave e o Eric Carmen continua aos gritos.

Qualquer semelhança com a Bridget Jones a bater no fundo do poço é pura coincidência! Só me faltava o pijama encarnado de flanela. (e o fundo do poço!)