19/02/2018

Vou chamar-lhe Maria

A Maria é uma mulher! Como eu! Como tu! A Maria casou por amor. A Maria acreditou que aquele Amor a ia fazer feliz. Para sempre. Como eu! Como tu! A Maria teve filhos. A Maria dedicou todo o seu amor aos filhos, àquele Amor, àquela família. Como eu! Como tu!

Só que o fado da Maria mudou...

Um dia aquele amor traiu-a. Um dia aquele amor fez a Maria sofrer. Um dia aquele Amor faltou-lhe. Faltou-lhe na consideração que lhe devia. Faltou-lhe no respeito que lhe devia. Faltou-lhe na proteção que lhe devia. Um dia aquele Amor deixou de ser Amor. Aquele Amor passou a ser decepção. Passou a ser medo. Passou a ser falta de respeito e de todo o mínimo de dignidade que um Amor precisa para ser simplesmente Amor.

A Maria desculpou. Porque achava que aquele Amor haveria de mudar. De se transformar em arrependimento. De voltar a ser o Amor que a Maria acreditou que a ia fazer feliz para sempre.

Mas aquele amor que já não era Amor não mudou. Aquele amor destruiu a Maria. Destruiu os seus sonhos. Destruiu a sua auto-estima. Aquele Amor fez a Maria sentir-se infeliz, feia, desmerecedora de respeito, desmerecedora de Amor. Não Maria! Não acredites nisso!!!

Aquele amor disse-lhe coisas que um Amor nunca diria. Aquele amor tratou a Maria como nenhum Amor poderia tratar. Deixou a Maria no chão. Nua de respeito, despida de proteção, vazia de dignidade. Não Maria! Não permitas isso!!!

Mas a Maria foi forte! Foi corajosa. A Maria um dia percebeu que não podia mais viver assim. A Maria percebeu que não podia mais permitir que aquele monstro, disfarçado de amor, continuasse a fazê-la acreditar que o monstro era ela. Um dia a Maria foi tudo aquilo que tem de voltar a ser! Mulher de garra e de força.

E eu só quero dizer a todas as Marias que me escrevem, que ninguém merece este tipo de amor! Quero dizer-lhes que qualquer Mulher neste mundo merece ser amada, merece ser respeitada, merece ser tratada com dignidade, com carinho, com Amor! Quero dizer a todas as Marias que nenhum homem neste planeta tem o direito de lhes roubar os sonhos, de as atirar ao chão, de as esfregar na lama da violência! Vocês são Mulheres! Só isso já é tudo! São lindas! São fortes! São corajosas!

Só quero dizer a todas as Marias que há muitos Homens que vos vão valorizar, respeitar, tratar e amar como se mais nada na Terra fosse mais importante que isso!

Que qualquer homem que vos faça sentir o contrário é mentiroso! É cruel! Cobarde! Fraco! Nojento!

Que o passo de se livrarem desses monstros era só o que precisavam para começarem a caminhar para uma vida feliz, para uma vida de paz, para uma vida de tranquilidade. Sem o medo da hora em que ele chega a casa. Sem o medo do que virá a seguir!

Força Maria! A tua coragem e a tua beleza, o teu bem-estar e a tua tranquilidade são as tuas maiores ferramentas. E os teus maiores objectivos.  Usa-os! Por ti! Pelos teus filhos!

A todas as Marias que me escrevem, sem me conhecer de parte alguma, a confiar (muitas vezes mais do que nas próprias famílias), eu só queria sair pelo e-mail e abraçá-las! Para lhes dar força, para lhes dar mimo, para lhes dar coragem!

Toma um abraço Maria!!!

3 comentários:

Anónimo disse...

olá Kiki,

eu sou uma Maria... mas ainda não fiz o grande passo... ao ler o texto sobre a « Maria» --- sinto-me assim... despida de tudo ... sem forças... pq estou de rastos... falta-me a força para deixar esse não amor para trás de mim....

Anónimo disse...

Não desistem. eu sou uma de muitas "marias". Digam basta. Informem-se e vão APAV ou instituições de apoio à vitima para vos ajudar...a sair disso.
Força. Precisamos de muita força porque é um longo percurso mas é a nossa vida/ saúde que está em causa e vale muito. Quem faz violência psicológica e física não ama, custou muito a perceber isso. A comunicação e os entendidos dizem quem faz uma vez mais cedo ou mais tarde volta a fazer outra, sim, é verdade. É horrível viver assim. Força e precisamos de muita.

Anónimo disse...

Deixo aqui o meu testemunho:

Eu era uma Maria. Até ao dia em que virei leoa, com um bebé nos braços, e arranquei o monstro lá de casa.
Não era esta a minha realidade. Não era esta a realidade que queria proporcionar ao meu filho.
Queixa, APAV, estatuto de vítima. Comissão de protecção de menores. Um pesadelo inimaginável. Uma espécie de purgatório pelo qual tive de passar para começar a encontrar a a serenidade e paz na minha vida. "Purgatório", na altura, a única palavra que encontrava para definir o sentimento de culpa que não me abandonava. Voltei para o monstro. Vestiu-se de cordeiro e voltou ao mesmo. Monstro, por mais disfarces que tenha em cima, será sempre um monstro. Cada vez pior.

Tive de "deixar morrer" dentro do meu coração, a pessoa que amava e que, julgava eu, me amava também. Mas aquilo... aquilo era tudo menos amor. Tive de lutar com todas as forças que desconhecia em mim, para me reconstruir enquanto ser humano, enquanto mulher. Ser mãe ajudou-me. Afinal ter um bebé nas mãos para cuidar, sozinha, cria capacidade de reacção. o luto foi sendo feito aos poucos. Caso encerrado. Falecido e sepultado.

Passaram pouco mais de 6 anos desde a minha separação. Há um ano voltei a ser agredida pelo "monstro", na rua. Voltei a fazer queixa. Sem medos e por uma questão de moral, não irei, nunca mais, calar-me desde aquele dia, há 6 anos, em que criei força para reagir. Ontem, finalmente, o monstro foi condenado por uma pequena parte do que fez.

O apoio da família e amigos foi determinante em todo este processo, assim como o longo percurso de psicoterapia que decidi percorrer e que, ainda hoje, percorro. De vez em quando, olho lá para trás, para mim, e sorrio. Consegui passar por isto tudo e reencontrar-me de volta. Então, pisco o olho ao meu eu antigo e penso "Continuas aqui, doce, alegre e carinhosa, como sempre foste! Não te perdi!". Ela pisca-me o olho lá de longe e diz-me "Que orgulho tenho na mulher em que te tornaste. Obrigada por não me teres perdido pelo caminho".

6 anos depois, continuo sozinha. Não tenho um namorado mas sou extremamente feliz! Mãe solteira pode!

Não se deixem ficar. Não se deixem perder pelo caminho. Saiam desse lugar mau onde ninguém merece viver. O caminho pode ser tortuoso, mesmo com o maior dos apoios à vossa volta, mas valerá sempre, sempre a pena! A paz e harmonia que se conquistam após todo o turbilhão vivido, vale tudo. E no fim aquilo que julgávamos ser o nosso purgatório, não foi mais do que um caminho para o reencontro connosco e com a vida em toda a sua plenitude.

Um Beijinho, Maria ;)